quarta-feira, abril 12, 2006

(des)inspiração

Hoje deixo a janela aberta. É noite, sei porque as cortinas, fechadas, estão menos claras, porque tudo lá fora é menos movimentado. Como tal, sinto que devo dar mais ritmo a esta calma, para que todo o aparente se desvaneça, quero subir o volume da aparelhagem e agitar o mundo. Quero tudo isto, mas também sei que alguém virá daqui a pouco para me cortar esta rebelião.

Com “City of angels” acabei a tarde, comecei a noite e na companhia de amigos recordo momentos da minha vida que dava como apagados da memória. Com “Íris” recordo cenários de paixão, de passos de aproximação, de letras decoradas e que se mantêm vivas na mente. Troco o CD, agora quero Fado, Mariza, Fado em mim.
Depois de cear nasce uma vontade de escrever. Um pouco como Caeiro, também faço o que faço pelo prazer momentâneo que uma dada acção me proporciona. Em contradição, estou (des)inspirado, quero demonstrar o quão me difícil é declamar sobre o que sinto e sobre o que me invade a alma. À medida que me expresso e tento digitalizar pensamentos demonstro o quão confusa é a minha mente. Não quero saber se me percebem, quero apenas saber se aquilo que escrevo faz sentido para mim.
Já de manhã tive a minha crise dos 20 anos. A verdade é que por vezes paro no meu dia e dou por mim a pensar que já vivi um quarto da minha vida, lembrando com saudade tudo o que fiz, aquilo que não fiz e as infantilidades que me acompanham e que ainda quero fazer.
Ontem aprendi que sem sempre as mensagens subliminares que por vezes tento emitir são entendidas. Sei que nem sempre consigo ser ouvido, todos nós sentimos isso. Tal como sou único, devo também respeitar os outros pela forma como se comportam e são. Não sou responsável ou maduro o suficiente para lhes dizer que certas formas de agir não se adequam a um determinado momento, porquê? Porque cada um é como é. Se querem ser assim, quem sou eu para me impor e criar regras de comportamento, também eu terei comportamentos que outros acharão incorrectos ou menos certos. Se me quero respeitar a mim, respeito os outros. Se não me são recíprocos, então crio barreiras, não me ganham confiança, nem me abro para ninguém.

Neste texto percebo o que mais me atinge e aflige, a minha pouca capacidade de expressão. Quero dizer coisas bonitas, quero saber escrever coisas que me inspirem a mim e a outros, mas não consigo. Todos os pulos temporais, frases sem qualquer nexo, crises existenciais que aparecem do nada, momentos de completa escuridão que assombram o pensamento cada vez que Mariza canta nos agudos, factores externos que influenciam a forma como escrevo, tudo muito confuso, tudo para me perder num texto em que o único objectivo é preencher um espaço em branco, porque parece mal parar por aqui, porque quero saber desenvolver temas, porque quero saber como exteriorizar o que de alguma forma não deveria ser deixado somente para nós próprios, estou e permaneço (des)inspirado, porque nada do que vos conto me parece fazer qualquer sentido para qualquer um de vós. Ao contrário de Mariza, continuo sem perceber nada, não posso dizer “Oh gente da minha terra, agora é que eu percebi, esta tristeza que trago, foi de vós que a recebi”, porque para nada do que digo penso ter coragem de dizer que me compreendo. Não estou à procura de respostas, porque não sei quais são as perguntas.

É Lisboa! Pois é! E depois? Gosto dela assim, gosto mas não quero e simultaneamente, quero percebê-la. E a janela continua aberta.

Traduzo ou lanço um desafio?
Interpreto o primeiro parágrafo. Tenho a janela aberta, algo que não costumo fazer, tal como hoje decidi partilhar convosco parte daquilo que sou. Contudo fecho as cortinas com receio de ser mal recebido e percebido, gosto de me acautelar para aqueles que tomam a abertura pessoal de alguém como objecto de brincadeira e demasiado regozijo. Vamos então agitar algumas cadeiras e contradizer-me com as próprias palavras, vamos agitar o mundo. Sei que me vou questionar, que me vão interrogar, por isso estou à espera de alguém que me mande acalmar.

2 comentários:

a_mais_linda disse...

falta clareza ao texto, mas nem sempre isso é mau...ás vezes, levados por frazes com pouca ligação formamos uma melhor ideia de quem as escreveu, porque é quase como vaguear pelo seu pensamento, e todos sabemos que não é possivel expressar nitidamente o que nos vai na alma

Tigas disse...

Para quem te conhece minimamente, o texto está mais do que claro.
Finalmente começo a ter o privilégio de ver o que anda por aí e apercebo-me do que há muito tempo me têm tentado explicar.
Talvez daqui a algum tempo consiga alcançar esse tão cobiçado prémio...